EFICÁCIA DO OTOMAX* NO TRATAMENTO DA OTITE BACTERIANA E FÚNGICA DE CÃES


Com o objetivo de estudar os agentes bacterianos e fúngicos envolvidos na otite externa de cães procedentes da Região Metropo-litana do Recife e avaliar a eficácia do Otomax* no tratamento desta patologia, foram utilizados 52 animais clinicamente doentes. As secreções otológicas foram submetidas a exames citológico e microbiológico. Os agentes mais prevalentes foram o Staphylococcus spp. (27,72%) e o Pityrosporum canis (22,77%). O Otomax* foi utilizado no tratamento de cães com otite bacteriana, fúngica ou associações destas, demonstrando eficácia de 100% nos animais avaliados.

INTRODUÇÃO

Segundo Greene et al. (1993) a otite externa resulta de qualquer inflamação do conduto auditivo externo, com numerosos agentes etiológicos envolvidos e fatores predisponentes que se relacionam com a infecção em cães e gatos. A resposta ao tratamento pode ser complicada devido às etiologias multifatoriais que concorrem para o estabelecimento das lesões (Balbi & Ramadinha, 1994).

A doença não tem predileção por sexo ou estação do ano, contudo, os cães de orelhas longas, especialmente spaniels, poodles, kerry blue terriers, labrador retrivier e raças com abundância de pêlos no conduto auditivo são mais acometidos (Kirk, Muller & Scott, 1985).

As inflamações precoces caracterizam-se por eritema e tumefação do epitélio de revestimento; a pele torna-se facilmente traumatizada ou ulcerada e secundariamente infectada, com surgimento de exsudato purulento ou hemorrágico. Exsudato aderente seroso e castanho claro é característico de infecções esta-filocócicas ou estreptocócicas, e exsudato amarelo é característico de infecções por bactérias Gram-negativas como Proteus spp., Pseudomas spp. ou Escherichia coli. Na presença de levedura, o exsudato fica aderente, seroso e castanho (Etinger et al., 1992).

Os microrganismos comumente isolados do conduto auditivo de cães são o Staphylococcus aureus, S. intermedius, Mal-assezia pachy-dermatis (Ettinger et al., 1992; Kiss et al., 1997; Guedeja-Marron et al., 1998). Aqueles isolados de ouvidos apresentando otite externa incluem os dois já citados, além de Proteus spp. e Pseudomonas spp. e especialmente nas infecções crônicas são relatados os Streptococcus b-hemolíticos, Escherichia coli e Bacillus spp. Em menor freqüência está o Streptococcus spp. (Bornard, 1992; Staroniewicz et al., 1995). Em aproximadamente 30% dos casos de otite, mais de um microrganismo é isolado (Kirk, Muller & Scott, 1985).

Ksiazek & Wawrykowicz (1995) encontraram em 84,5% de amostras positivas ao exame microbiológico, 26,4% de infecção bacteriana, 19,9% de infecção fúngica e 38,2% de infecções mistas (bactérias + fungos). Goulart (1997) observou que em 71,8% dos casos de otite externa foi isolada apenas uma espécie bacteriana, enquanto que 28,2% dos casos apresentavam dois ou mais agentes envolvidos.

Leite et al. (1997) pesquisaram a flora bacteriana de 50 cães com otite externa sintomática e as bactérias isoladas foram: Staphylococcus spp. (38%), Streptococcus spp. (20%), Bacillus spp. (18%) e Gram-negativos (7%).

No Rio Grande do Sul, Fernandes & Gomes (1979) mostraram o envolvimento de Staphylococcus spp. em 23,3% das otites de cães, seguido por Pseudomonas spp. como agente de 22,7% dos casos e Ptyrosporum canis em 10,2% das otites.

Segundo Carter (1996), a levedura Pityrosporum canis tem sido isolada tanto de ouvidos normais quanto otíticos.

Blanco et al. (1996) isolaram 51% de levedura em cães com otite externa e ressaltaram sua importância na patogenicidade de otites crônicas em cães.

As otites causadas por Candida sp. e Aspergillus sp. são raras, porém o Pityrosporum canis é mais freqüente nas otites em cães (Corrêa & Corrêa, 1992).

A seleção de medicamentos otológicos específicos tem como base o agente etiológico causador da otite externa, o estado do tímpano e a resposta orgânica ao processo nosológico (Guene et al., 1990). Antibióticos de uso tópico são mais eficazes (Guedeja-Marron et al., 1998).

O objetivo desse estudo foi identificar os agentes bacterianos e fúngicos envolvidos na otite externa de cães procedentes da região Metropolitana do recife, e avaliar a eficácia do Otomax* no tratamento desta patologia.

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo foi conduzido no período de agosto de 1998 a maio de 1999. Foram utilizados 52 cães, machos e fêmeas de idades e raças variadas, com diagnóstico clínico de otite externa, totalizando 80 ouvidos, e procedentes de diferentes localidades da Região Metropolitana de Recife. O exame clínico foi realizado de acordo com Kirk, Muller & Scott (1985), utilizando-se o otoscópio, anotando-se a história e realizando-se posteriormente o exame físico da orelha.

A secreção do conduto auditivo foi obtida mediante utilização de “swabs” estéreis, após prévia limpeza do pavilhão auricular com solução de éter etílico.

Os exames citológicos da secreção foram realizados em esfregaços em lâminas coradas pela técnica Gram, observados em microscopia de imersão, anotando-se o número de leveduras por campo examinado, além da presença de bactérias Gram-positivas e negativas. Foi observada também a presença de leucócitos com modificações degenerativas ou fagocitando bactérias. Considerou-se positivo para Pityrosporum canis contagem acima de 10 células por campo, em objetiva de 100x, além do isolamento em cultura.

A secreção otológica foi cultivada em ágar base enriquecido com 10% de sangue de ovino e ágar Levine. As placas foram incubadas a 37o C, efetuando-se as leituras com 24 e 48 horas, anotando-se os aspectos de crescimento das colônias. Realizou-se a técnica do Gram para todas as colônias isoladas.

Para classificação presuntiva dos Staphylococcus spp., utilizaram-se as provas de catalase, coagulase, produção de hemólise em ágar sangue, pigmentação das colônias, utilização de carboidratos (glicose, manitol e maltose) e DNAse. Para classificação das enterobactérias utilizou-se as provas bioquímicas de citrato, lisina, ágar tríplice ferro açúcar (TSL), vermelho de metila (VM), Voges Proskauer (VP), indol, uréia e motilidade, segundo Carter (1979).

A amostra de Candida sp. foi classificada através da morfologia celular à técnica do Gram, além de provas de fermentação de glicose e formação de clamidosporos e tubos germinativos.

Após a identificação bacteriana, as colônias foram repicadas para o caldo infuso cérebro coração (BHI), incubadas a 37o C e transferidas com “swab” estéril para placas de Petri, contendo ágar Müler Hinton, para avaliar a sensibilidade bacteriana in vitro, frente a diferentes drogas antimicrobianas (gentamicina, amoxilina, kana-micina, carbenicilina, florfenicol, cloranfenicol, penicilina, norflo-xacina, amicacina, lincomicina, cefalexina, neomicina e polimixina B). A leitura foi realizada 24 horas após a incubação das placas a 37ºC, medindo-se os halos de inibição e comparando-os com tabelas fornecidas pelos fabricantes dos discos de antibióticos.

A avaliação da eficácia do tratamento foi realizada nos ambulatórios do Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e consistiu de quatro etapas: identificação dos agentes etiológicos (bacterianos e/ou fúngicos) isolados em culturas da secreção otológica, comprovação da sensibilidade bacteriana in vitro à gentamicina e tratamento tópico das lesões, utilizando o Sulfato de Gentamicina associado ao Valerato de Betametasona e Clotrimazol (Otomax*) na posologia indicada pelo laboratório fabricante. O produto foi usado em cães com otite fúngica, bacteriana e naquelas causadas pelas associações de bactérias e bactérias e fungos. A etapa final consistiu em nova avaliação clínica após o término do tratamento, sendo considerados curados aqueles animais que não apresentarem alterações detectadas ao exame.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com relação aos resultados obtidos no exame microbiológico de secreção otológica de cães com otite, verificou-se que Pityrosporum canis foi um dos agentes mais freqüentemente observados (Tabela 1). Os dados obtidos neste estudo estão de acordo com Ettinger et al. (1992) e Corrêa & Corrêa (1992), que se referiram ao agente como sendo o mais comum nas otites em cães.

Esta observação torna cada vez mais freqüente a utilização de exames laboratoriais que diferenciam as infecções fúngicas daquelas causadas por bactérias, corroborando com as afirmações feitas por Greene et al. (1993) quanto à seleção de medicamentos específicos para tratamento da otite externa, relacionado ao agente isolado, e Corrêa & Corrêa (1992) que relataram os insucessos terapêuticos que ocorreram nas otites de cães quando não se empregam a cultura e antibiograma, e se utilizam de antibióticos que não têm efeito terapêutico em fungos.

O emprego do exame citológico da secreção otológica através da microscopia direta em lâminas coradas pelo método de Gram mostrou-se um método simples, rápido eficaz para se ter uma avaliação precoce do agente envolvido, até que o exame microbiológico possa ser realizado. Neste estudo, este tipo de exame mostrou-se bastante satisfatório no diagnóstico de leveduras de gênero Pityrosporum canis, Candida albicans, além da presença de leucócitos degenerados ou fagocitando bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Com relação aos agentes bacterianos isolados (Tabela 1), observa-se que o gênero Staphylococcus foi isolado com maior freqüência (27,72%), concordando com as citações feitas por Leite et al. (1997), Fernandes & Gomes (1979), Corrêa & Corrêa (1992), Ettinger et al. (1992) e Goulart et al. (1997), variando apenas as freqüências das espécies do gênero.

O Streptococcus spp. foi isolado em apenas 3,96% das amostras, representando um percentual relativamente baixo, se comparado àqueles obtidos por Corrêa & Corrêa (1992) e Goulart et al. (1997). Contudo está próximo ao índice relatado por Ettinger et al. (1992).

Os microrganismos Gram-negativos mais isolados foram Pseudimonas spp. (13,86%) e Proteus spp. (7,92%) (Tabela 1). Em relação ao primeiro, foi citado como o Gram-negativo mais isolado por Corrêa & Corrêa (1992), Ettinger et al. (1992), Fernandes & Gomes (1979), enquanto que Goulart et al. (1997) citaram este gênero como o segundo Gram-negativo mais isolado. Com relação à sensibilidade antimicrobiana in vitro, observou-se que 100% das amostras de Staphylococcus spp. apresentaram sensibilidade à gentamicina e cefalexina, 75% mostraram-se sensíveis ao cloranfenicol e 62,5% à ampicilina.

Fazendo-se uma avaliação geral das bactérias envolvidas e da sensibilidade aos diferentes antibióticos, observou-se que a gentamicina foi a droga que apresentou melhores resultados (96,48%) tanto para amostras Gram-positivas quanto para Gram-negativas, sendo uma das alternativas de tratamento quando não se pode realizar o exame microbiológico e o antibiograma. Um achado relevante neste estudo foi a associação de agentes bacterianos e bacterianos e fúngicos (Tabela 2), como relatado por Kirk, Muller & Scott (1985), Ettinger et al. (1992) e Goulart et al. (1997). Estas associações ocorreram em 31,68% do total de 80 ouvidos com otites estudados. Esta percentagem é similar àquela citada por Goulart et al. (1997). Associações de diferentes tipos de bactérias em 34,37% dos casos de otite e de bactérias com leveduras foram observadas em 65,62% dos casos. Esta observação é importante no que se refere ao tratamento das otites caninas e mais uma vez reforça a utilização de exames microbiológicos que confirmem estas possíveis associações, e que favoreçam um tratamento adequado e com menor índice de recidivas.

Neste estudo, teve-se a oportunidade de acompanhar quinze cães tratados com Otomax* que retornaram após o tratamento para novo exame clínico. Todos os animais mostraram resposta satisfatória, demonstrando eficácia de 100% do produto na cura clínica. Estima-se que um maior número de animais possam ter apresentado resultados semelhantes, contudo a falta de retorno ao término do tratamento, impossibilitou que estes fossem incluídos neste estudo, que aumentaria ainda mais a freqüência observada dos cães com cura das lesões.

Em decorrência da diversidade de agentes etiológicos envolvidos em otites de cães, constatada neste estudo, a utilização de exames microbiológicos e testes de sensibilidade antimicrobiana in vitro são medidas indicadas no tratamento. Contudo quando esse procedimento não for possível, a utilização do Otomax* mostrou-se bastante satisfatória no tratamento desses animais.

Trabalho vencedor do Prêmio de Pesquisa Clínica
Schering-Plough Veterinária 1999(categoria Otomax®)

R. A. Mota 1, J. K. O. Farias 2, L. B. G. da Silva 3,
E. T. de Lima 2, A. A. F. Oliveira 3, R. T. D. de Moura 2